terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Saudade

Li em algum lugar que hoje é dia da saudade. Para mim, saudade é coisa de todo dia. Um dia a gente sente saudade de alguém, no outro da comida gostosa da vovó, em outro ainda, saudade da infância, e por aí vai.
Falava de saudade um dos primeiros poemas que decorei e que eu declamava apaixonada apesar da pouca idade. Eis:
***
SAUDADE

Bastos Tigre

Saudade, palavra doce,
Que traduz tanto amargor!
Saudade é como se fosse
Espinho cheirando a flor.

Saudade, ventura ausente,
Um bem que longe se vê,
Uma dor que o peito sente
Sem saber como e porquê.

Um desejo de estar perto,
De quem está longe de nós;
Um ai que não sei ao certo
Se é um suspiro ou uma voz.

Um sorriso de tristeza,
Um soluço de alegria,
O suplício da incerteza
Que uma esperança alivia.

Nessas três sílabas há de
Caber toda uma canção:
Bendita a dor da saudade
Que faz bem ao coração.

Um longe olhar que se lança
Numa carta ou numa flor,
Saudade – irmã da esperança,
Saudade – filha do amor.

Uma palavra tão breve,
Mas tão longa de sentir
E há tanta gente que a escreve
Sem a saber traduzir.

“Gosto amargo de infelizes”
Foi como a chamou Garrett;
Coração, calado, dizes
Num suspiro o que ela é.

A palavra é bem pequena,
Mas diz tanto de uma vez;
Por ela valeu a pena
Inventar-se o português.

Saudade – um suspiro, uma ânsia,
Uma vontade de ver
A quem nos vê à distância
Com os olhos do bem querer.

A saudade é calculada,
Por algarismos também:
“Distância” multiplicada
Pelo fator “Querer bem”.

A alma gela-se de tédio
Enchem-se os olhos de ardor...
Saudade – dor que é remédio,
Remédio que aumenta a dor.
***
Pois então é isso. Está mais do que explicado o que é saudade, mas sempre cabe dizer mais alguma coisa.

Sinto saudades sim...
Saudades do meu amor por você,
Saudades do seu amor por mim.
Sinto saudades da certeza
Que ele duraria após a morte,
Pois era puro, sincero e forte.
Sinto saudades do que guardei com tanto carinho
E que foi varrido como poeira
Para não ocupar um só cantinho.
Lembranças nunca são banidas
Quando gravadas no coração.

Lilia Maria

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Desinspirada


Se a ponta do lápis quebrar
A poesia não fica perdida,
Apenas espera mais um pouco
Para ter a sua forma.
O que acontece muitas vezes
É a idéia não vingar
E a inspiração acabar.

Lilia Maria

Ando pobre de idéias... Vem inspiração, vem...

sábado, 28 de janeiro de 2012

Enigma


A força do vento
Que à noite soprou
Levou para longe o pensamento
Que no coração brotou.

Palavras espalhadas,
Sem sentido algum,
Juntadas contam o segredo
Que um dia a alma guardou.

Segredo contado
Já não é mais segredo,
É apenas a história
Que o tempo revelou.

Lilia Maria

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Cotidiano


Não tinha como saber
Quando ia aparecer,
Então tinha que esperar
Sem muito reclamar.
Esperava para o almoço,
E a comida era sempre deliciosa.
Esperava para o jantar,
E as velas eram acesas.
Esperava para o lanche,
E o café fumegava na xícara.
Esperava para dormir,
E os lençóis tinham cheiro de alfazema.
Era a rotina do dia a dia
Para fazer o tempo passar.

Lilia Maria

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Poetizando (IV)


Não fique à margem da vida
Que a dança acaba de começar
E não tem pressa de terminar.
A morte não cessa a história
Que Deus escreve devagar.

Lilia Maria

Amor perdido


De repente a lágrima fria
Molha a face onde se via
Apenas os traços de alegria.
Foi um dia de almas em festa,
De braços em muitos abraços,
De amor completo,
De entrega,
De parceria.
Desfaz-se o tênue laço,
Mas o vínculo permanece
E junta cada um dos pedaços
Das partes partidas e repartidas,
Das emoções ainda não vividas.
A minha metade não é nada
Sem a outra metade perdida.

Lilia Maria

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Paulistana sim senhor


Sou caipira,
Mas não sou de Pirapora,
Sou dos campos Piratininga,
Da São Paulo desvairada,
Da cidade cheia de vida,
Da selva civilizada.

Sou cidadã cosmopolita
Desta metrópole imensa e intensa,
Que se desdobra em paisagens diferentes,
Que tem problemas e virtudes,
Que a todos acolhe como mãe generosa,
Que encanta,
Que exaure.

Paulicéia dos meus amores,
Sou filha cativa das suas entranhas.
Se eu partir um dia,
Com certeza voltarei,
Cheia de saudade e alegria,
Para esta terra que tanto amei.

Lilia Maria

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Yo ho Dick!


“Vou ver o filme do Rin Tin Tin” – foi assim que a Julia anunciou que iria ao cinema na tarde de sábado. “Manda lembranças para o Cabo Rusty e para o tenente Masters!”. Ana e eu sorrimos deliciadas com lembranças da nossa infância.  
Agora cedo, fazendo hora na cama para levantar, fiquei recordando aquela série de TV dos anos 50. Não perdia um episódio sequer, e sempre torcia muito para que terminasse tudo bem para os “mocinhos” da história. 
Para quem não conheceu esta série, ela se desenrolava no velho oeste americano. Rin Tin Tin era um cão pastor alemão que vivia em uma unidade da Cavalaria dos Estados Unidos, Forte Apache, no final do século XIX. Seu dono era o Cabo Rusty, um garoto órfão que havia perdido os pais em um ataque dos índios e foi adotado pela corporação, se tornando uma espécie de mascote. Quando se via em perigo, Rusty gritava “Yo ho Rinty!” e o cão aparecia para ajudar. Para encher de fantasia os olhas das mocinhas, um dos personagens principais era o Tenente "Rip" Masters. O lado hilário da trama era sempre protagonizado pelo atrapalhado Sargento O`Hara, uma figura...
Na época eu tinha um cãozinho vira-latas de nome Dick. Apesar de ser pequeno era valente e enfrentava qualquer um que se aproximasse da gente e que ele não conhecesse.
Muitas vezes, quando estávamos passando o fim de semana no sítio, brincávamos de Rin Tin Tin, ou melhor, de “Dickintin”. Enveredávamos pela mata, andávamos pelas plantações, pelas estradinhas e pelo pasto em busca de alguma aventura. O Dick não desgrudava da gente, era um fiel companheiro e nós nos sentíamos seguros, pois se tivéssemos problemas era só gritar “Yo ho Dick!”.

Lilia Maria

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Alors

Après l'adieux
Tout est vide,
Sans vie
Sans la volonté,
Sans la vérité,
Sans amour,
Sans chaleur
Pas de couleur.
Sans un peu de toi,
Sans un peu de moi.

Lilia Maria

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Chicão, minha eterna paixão

Sempre gostei muito de música. Quando era pequena, e isso já contei em algum post, deliciava-me ao ver minha mãe tocando harmônica.
Quando eu tinha mais ou menos 7 anos queria aprender a tocar piano. Na casa ao lado da nossa morava uma família de árabes. Ana, a filha mais velha, dava aulas e diversas vezes me perguntou se eu não queria aprender. Meu pai dava um monte de desculpas e sempre ficava para mais tarde.
Quando minha irmã manifestou o desejo de aprender, meu pai achou que era a hora para mim também, mas o meu encanto havia acabado. Até fui, pois alguém tinha que levar a pequena, mas não era mais o que eu queria. Nesta época eu queria aprender a tocar violão.
Apesar de ter uma “violinha” em casa, naquele momento ele achava que eu deveria continuar com o piano, e fim. Em casa era assim. A única que sempre conseguia o que queria era minha irmã. Minha mãe dizia que era mais fácil fazer o que ela queria do que aguentar a amolação. Ela era MUITO insistente. E convincente... Sempre vencia no grito. Mas isso não vem ao caso.
Quando fui estudar na EESC, um dia apareceu um curso de violão como optativo. Amei. Pedi a tal violinha emprestada e fui lá fazer o tal curso ministrado pelo maestro Geraldo Menucci.
A minha violinha foi motivo de muita chacota, a começar pelo fato que, guardada há mais de 15 anos nos armários da minha casa, ela permanecia com as cordas originais de aço e não de nylon como eram usadas então. O som não era ruim, mas de violão a minha violinha tinha muito pouco.
Acabei ganhando um violão igual ao do Pestana, meu namorado da época. Foi um presente de Natal adiantado. Nem é preciso contar que foi comprado por um precinho bastante camarada porque a cor laranja do tampo assustava os compradores. Este detalhe foi motivo de outro tanto de comentários maldosos, claro, mas o meu argumento era perfeito: o meu era único... Enfim... Apaixonei-me pelo meu laranjinha que acabou batizado de Chicão.
O nome tem a ver com a música “Meu refrão” do Chico Buarque:
Quem canta comigo,
Canta o meu refrão
Meu melhor amigo
É meu violão
Ele era (e é) o meu melhor amigo. Era bater tristeza ou alegria que lá estava abraçada com ele. Tocar eu não tocava nada, mas esquecia da vida tentando.
Minha maior dificuldade estava com a pestana... (com o Pestana eu não tinha nenhuma, tanto que continuamos amigos até hoje). Era tentar e o som sair todo desafinado. Virei desafio para a minha última professora. Ela tentava a todo custo me fazer acertar e como não conseguia ficava buscando alternativas para os acordes.
O Chicão trouxe muita música e muita alegria para a minha vida. Por anos fui responsável pelo canto nos cursos de noivos do Colégio São Luiz. Com a minha amiga Eliana Habib, montamos uma missa toda cantada com acompanhamento de violões na E.M. Celso Leite. Ela marcava um trabalho conjunto entra a escola e a paróquia de N. S. Achiropita conta a violência.
Apesar de tudo isso, sempre fui muito tímida e não tocava em público. Sempre havia uma desculpa e lá ia o Chicão para outras mãos... Eu tocava e cantava muito em casa, principalmente quando minhas filhas eram pequenas. Cantamos Vinícius para crianças de A a Z. A porta, A casa, O pato, A pulga, Valsa para uma menininha, e todas as outras faziam a delícia das nossas tardes musicais, mas era chegar alguém e o Chicão virava espectador...
Acho que por uma única vez toquei em público... Foi terrível... Montei um coral com os formandos e um aluno de outra série fazia o acompanhamento. Na hora da festa ele não veio. Aí lá fomos nós, Chicão e eu, para o palco. Sentei na escada, respirei fundo e dei os primeiros acordes da música “O caderno”. Ficou lindo apesar dos meninos se recusarem a cantar a parte da música que diz “Quando surgirem seus primeiros raios de mulher”. Foi uma grande surpresa para os pais ver a professora de matemática fazendo uma coisa que normalmente seria tarefa da professora de artes.
O Chicão passou das minhas mãos para as da minha filha Andrea. Viajou com ela, teve a sua caixa rachada, o braço empenado, deixou de ter acordoamento Augustine, mas continua com seu som lindo. E agora está de volta.
Como “quem canta os males espanta”, ando cantando de novo, mas nada novo, só as músicas velhas que me fazem mergulhar numa alegria que só eu sei.

Lilia Maria 

Repostagem uma publicação de "Folhas Soltas" de 14/10/2010 (esta data tem história).

Freddie, o francês


Quando optei por comprar um carro “francês”, minha filha mais nova, possuidora de um Clio, perguntou qual seria o nome do “rebento”. Como o dela foi batizado de Pocoyo, eu falei que poderia ser Pocoyo Junior (por que é mais novo) ou Senior (por ser maior). Mas não senti firmeza na minha resposta, não era este o nome.
Lembrei que o meu primeiro carro chamava Kaká. Era uma Brasília meio amarela de placa KK 4110. Então era preciso esperar o documento do carro para ver se brotava inspiração. Chegou, mas não pintou.
Na semana passada foi buscar o meu lindinho na concessionária. As meninas ficaram encantadas. Saímos para dar uma volta, deixamos a Luciana em sua casa e lá fui eu e a Andrea até a casa do Ricardo, o namorado dela. No caminho, entre muitas brincadeiras utilizando as facilidades incorporadas ao meu carrinho, atinei: Fred, o francês. Este era o apelido de um dos meus colegas de turma da Escola de Engenharia de São Carlos.
Gilles Philippe Lucian Garnero (não sei se é assim que se escreve), cujo apelido era Fred, era uma figura sui generis. Alto, muito magro, cabelos negros e lisos, usava um par de óculos de grau com lentes avermelhadas e falava com sotaque carregado. Ele realmente era francês. Estava há pouco tempo no Brasil. Batíamos longos papos misturando as duas línguas. Era uma delícia.
A lembrança mais viva que tenho do Fred foi a estréia do carro que ele ganhou por ter entrado na faculdade. Era um buggy vermelho com capota removível preta. No dia da estréia ele resolveu passar na minha casa aqui em São Paulo para levar minha irmã e eu para darmos uma volta. No caminho ele foi surpreendido por uma chuva pesada. Quando ele chegou na minha casa, o carro parecia uma enorme banheira. Tiramos a água de dentro dele de balde.
Não sei que fim levou o Fred. Ele acabou abandonando a engenharia e prestou um novo vestibular para medicina. Perdemos o contato. Já procurei muito por ele, mas não encontrei. É provável que ele tenha retornado à França.
Assim, meu carro foi batizado. Freddie em vez de Fred é por causa do dono da voz mais incrível que já escutei: Freddie Mercury.
Espero curtir muito o meu doce e lindo francês. Que ele seja meu parceiro em muitas aventuras.

Lilia Maria

domingo, 15 de janeiro de 2012

Vida


A vida não é um caminho
Que se anda em linha reta,
Há atalhos, encruzilhadas,
Pontos de inflexão.

A vida não é cantiga
Com um único refrão.
Um verso puxa outro,
E nasce uma nova canção.

A vida não é um livro,
Mas toda uma coleção
Onde histórias se entrelaçam
E pedem continuação.


A vida não se explica
Com uma simples comparação,
Pois cada um de seus momentos
Tem a sua dimensão.

Lilia Maria

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Amor

Amor não pesa,
Mas se faz presente.
É transparente,
Mas tem cor,
Odor,
Sabor.


Amor não cessa,
Mas muda de estação
E evapora de repente
Num tórrido verão.


Lilia Maria

Poetizando (III)

Vim de tempos imemoriais
Buscar um pouco de ti.
Encontrei...
Perdi...
Guardei no infinito
O que foi bom e bonito.
O resto?
Esqueci.

Lilia Maria

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Recado


Nas horas tantas
O Zé das Quantas
Deixa um recado no mural.

Escuta só criatura santa,
De olhar doce e alma pura,
Vai viver a vida
Que sua missão é comprida
E dela não se pode esquivar
Pare de pensar “e agora?”
Que o presente já virou passado
No segundo que acabou de passar.
Vai ser feliz sem demora,
Pois a felicidade só vai embora
Se você deixar escapar.

Lilia Maria

domingo, 8 de janeiro de 2012

Talismã


Quem sabe a sorte ou a sina
Que faz de novo eu ser menina
E procurar entre os guardados
Aquele pequeno talismã.
Não é uma jóia preciosa,
Mas vale mais que tudo que tenho,
Mesmo sendo um papel pequeno.
Ah! As histórias que são contadas
Entre as letras ali grafadas,
Que mesmo sem saber deixou marcas
Que o tempo nunca irá abrandar.

Lilia Maria

Dizem que quem rasga dinheiro é louco.
Em algum momento da minha vida eu cometi esta loucura e dividi com alguma amiga uma cédula de dinheiro com algumas assinaturas. Certamente a nota não devia ter grande valor, mas a assinatura que ficou gravada foi um dos bens mais preciosos que guardei por anos e anos. Provavelmente deve ainda estar em alguma caixinha cheia de outras coisas que nunca joguei fora. São pedaços da vida que contam histórias.

domingo, 1 de janeiro de 2012

Oração


Anjo torto
De asas quebradas
Ouve a oração
Que faço agora.
A ti confio os meus sonhos,
A esperança de encontrar
Essa tal felicidade
Que todos querem achar.
Não que eu seja infeliz,
Mas falta um triz.

Lilia Maria