segunda-feira, 30 de junho de 2014

Consequências

 Hoje eu sei a duras penas,
Que não precisava escutar
Tantas palavras ocas
De uma boca
Que eu só queria beijar.
Beijo bom, confesso,
Mas ficou cara a brincadeira
De viver a tardia adolescência
Que agora não quer findar.

Lilia Maria

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Um pouquinho de mim

 Nasci na cidade de São Paulo no dia 13 de dezembro de 1952. Fui batizada Lilia Maria, nome herdado de minhas avós. Dona Lilia foi uma mulher de valor, trabalhou muito quando jovem e na terceira idade acomodou-se. Era extremamente vaidosa, briguenta, curiosa e muito sociável. Já a vovó Maria era uma mulher muito tranquila, sábia, dedicada à família, exímia cozinheira, simples e descomplicada. Tenho um pouco de cada uma delas, mas não sei se o que elas tinham de melhor. 

Quando alguém me pergunta qual a minha ascendência, respondo sem pestanejar: italiana, sou puramente italiana. E sou. Tanto meu pai quanto minha mãe são netos de italianos natos. São quatro famílias (Melani, Scuracchio, Castiglione e Faccio) que tiveram suas sagas na busca de melhores horizontes aqui no Brasil no final do século XIX.

Meus pais eram de diferentes cidades do interior paulista. Ele, Breno Faccio, nasceu em Ribeirão Preto em 1924, mas em 1941 veio com a família para a capital paulista e aqui montaram uma oficina mecânica na região central da cidade. Ela, Lygia Scuracchio, nasceu em Terra Roxa em 1931, mas foi criada em São Carlos. Foi lá que eles se conheceram em 1949 quando meu pai passava alguns dias na casa dos seus tios, moradores daquela cidade. Depois de apenas 7 meses estavam casados. Hoje, ainda vivos, já completaram 64 anos de união. Meu pai diz sempre que o segredo de tão longa convivência é a paciência para esperar a paixão acontecer diversas vezes durante toda vida. Eles tiveram 3 filhos dos quais eu sou a do meio. 

Tive uma infância e adolescência tranquila e a minha maior alegria eram as férias na casa dos meus avós maternos. Lá eu me sentia livre e feliz e isto foi determinante na hora de prestar meu primeiro vestibular. Eu queria cursar medicina, mas meu pai não permitia. Depois de ter sido reprovada em matemática, decidi que iria ser professora desta matéria. Fui aprovada para o Campus da USP de São Carlos. Logo no início descobri que a modalidade do curso oferecido que não era bem o que eu queria, pois lá só havia Ciências da Computação e eu não tinha afinidade nenhuma com aquelas máquinas infernais. Eu tinha então duas opções: vir para São Paulo para fazer licenciatura ou pedir transferência para engenharia. Acabei voltando para casa e praticamente comecei tudo de novo.

No ano seguinte prestei um novo vestibular e desta vez fui aprovada para a Escola de Educação Física, também na USP. Quando eu estava no último ano dos dois cursos, optei por acabar primeiro a Matemática e tranquei matrícula no outro com o firme propósito de terminar no ano seguinte, mas nunca mais voltei.

Uma vez formada, fui trabalhar com o Professor Scipione di Piero Neto, um renomado autor de livros didáticos, hoje já falecido. Ele foi meu mestre, meu espelho, minha inspiração. Através dele eu aprendi a amar de fato a matemática. Entre as coisas que com ele aprendi, há uma que eu sempre falava para os meus alunos e aqui vou deixar registrada:
Matemática não se aprende por inspiração e sim por transpiração. Enquanto não se usar muito papel, lápis e borracha para se fazer e refazer exercícios, nada será aprendido.
 Dizem que o ser humano se realiza depois de plantar pelo menos uma árvore, ter um filho e escrever um livro. Se isto é verdade, então já cumpri minha missão, e com folga. Foram muitas árvores plantadas, dez livros publicados e duas filhas incríveis.

Fui professora de matemática, de física, de desenho geométrico e de informática. Acabei me tornando Analista de Sistemas especializada em informatização de acervos e em geotecnologias. 

Em 2008 me aposentei e para não enferrujar os neurônios fui fazer mestrado em Engenharia da Informação na Universidade Federal do ABC. Não gostaria de parar por aí, então um doutorado ainda faz parte dos meus planos. 

Irrequieta por natureza, estou sempre buscando coisas novas para "enfeitar" a minha vida. Passeio entre cálculos e teoremas, mas transito calmamente pela paixão em escrever e os trabalhos manuais. Muitos acham estranho que uma pessoa tão da área de exatas possa se dedicar tarefas tão “humanistas”. É justamente este paradoxo que me mantém viva. E assim eu vou. E assim eu sou.


Lilia Maria

 

terça-feira, 3 de junho de 2014

Memórias do radio

Quando recebi a proposta de falar sobre minhas recordações que estivessem diretamente ligadas ao rádio, prontamente retruquei: nenhuma, nasci junto com a televisão. Comecei a escutar o meu grupo contar suas histórias, dei muitos palpites, mas continuei firme no meu discurso. Definitivamente o rádio não tinha grande significado para mim.

Depois, voltando para casa, entrei dentro do carro e ao ligar o contato, a voz do Milton Nascimento cantando “Canção da América” me fez parar e pensar: gente! O rádio não é passado, ele está aqui! Ele fez e ainda faz parte da minha vida. Claro que a TV é muito mais presente, mas quem me faz companhia nas horas do trânsito intenso? Não é a Rádio Sulamérica Trânsito que me diz porque eu estou já meia hora parada no congestionamento? Quem me faz rir com os esquetes engraçados da MIX? Quero ouvir um pouco de notícias? Lá estou eu com a CBN no ar. 

Aí as histórias começaram a pipocar. Muitas não foram por mim vividas, mas são as lembranças do meu pai, como por exemplo, quando ele ainda garoto ajudou um tal engenheiro Juca a montar a PRA-7 de Ribeirão Preto. Ou quando ele montou o seu primeiro radio de Galena

Nos muito antigamente, rádio era a peça principal da decoração de muitas salas. Eram enormes, feitos com válvulas. Exalavam muito calor. Lembro-me bem daquele que existia na casa dos meus avós na cidade de São Carlos. Eu era bem pequena e lá não havia torre de retransmissão de TV. Nas férias eles recebiam os netos. Era uma barulheira só de crianças saudáveis brincando o tempo todo. Mas tínhamos que parar na hora do noticiário. A solução que o vovô encontrou foi encher uma folha de papel de contas. Tínhamos que efetuá-las antes de voltar a brincar. Era o tempo exato para que ele ouvisse as notícias do dia. E foi assim que eu desenvolvi a minha habilidade com números.

As válvulas um dia deram lugar aos transistores e assim surgiram os rádios portáteis. Este era o sonho de 10 entre 10 pessoas no início da década de 60. Rádio portátil era tudo de bom. Funcionava à pilha, dava para levar dentro do bolso e colocar debaixo do travesseiro para ouvir música na hora de dormir. Eu fiquei muito feliz quando ganhei o meu de presente de Natal em 1966. Era lindinho, todo cor de rosa, com uma capa de couro clarinho e cabia na palma da minha mão. Virou meu companheiro inseparável. 
 
Nos meados dos anos 60, quando a Jovem Guarda chegou pra valer, além dos programas de televisão, quase todos os ídolos tinham um programa na Jovem Pan (que era apenas a radio Panamericana de nova roupagem). Eu adorava. Eram cartas respondidas, eram músicas tocadas, histórias de parcerias, enfim era o meu mundinho ali, ao meu alcance, sem ter que pedir ordem para os meus pais para ligar o rádio ou a televisão. 


Lembro-me bem da voz do Roberto Carlos, do seu risinho inconfundível, reclamando mais uma vez da Candinha (que fazia um programa de fofocas na mesma rádio). Lembro-me dele falando dos seu amigos inseparáveis, o Erasmo Carlos e a Wanderléa, das músicas da Martinha, Trio Esperança, Wanderlei Cardoso, Vanusa, Antonio Marcos, das suas próprias e de outros tantos, cujas letras eu tentava copiar para transcrever para o meu caderno de canções.
Tempos bons! Incríveis! Inesquecíveis.


 
Lilia Maria